Blog/

Mão-de-Homem

Publico quadrinhos autorais e textos na página Leia com Preguiça que você pode seguir no facebook e no insta nos ícones abaixo.

Mão-de-homem

Numa limpeza de quintal ouvi o termo “mão-de-homem”. Não aprendi com meu pai. Aprendi com o pai de um amiguinho que nos colocou para limpar umas telhas. O que ele quis dizer é para que não pegássemos as telhas com as pontas dos dedos demonstrando o nojo do lodo e da bosta de pombo. Era para pegar de mão cheia, com “mão-de-homem”, para que o serviço rendesse.

Lembro dos dedinhos da minha falecida avó, que tinha as juntas molinhas, com o courinho solto. Gostava de me sentar no colo dela e apalpar aquele fofinho. A minha avó tinha mais mão-de-homem que qualquer um: plantava, colhia, rachava lenha, fazia crochê, cozinhava e ainda assim a mão era fofinha.

Ainda criança vi alguns vasos de cerâmica e frascos de tintas esquecidos em algum lugar e perguntei se poderia usar. Comecei a pintar florais nesses vasinhos. A mão que segurava a cerâmica era mão-de-homem. A mão que aplicava delicadamente o pincel era fofinha. Não em equilíbrio, mas como duas coisas diferentes agindo por uma mesma finalidade.  

Quando comecei a pintar vasinhos, não demorou e alguém disse: “Se deixar esse menino fazer essas coisas ele vai virar veado”. Apesar do incomodo, fui me tornando um pintor melhor e comecei a pintar cerâmicas maiores. Até quem me chamava de veado começou a perguntar se eu pintaria algum vaso com um distintivo de um time e eu acenava com a cabeça que não enquanto pensava: “Ainda não pego encomenda de escroto”.

Trinta e cinco anos depois ao visitar a casa da minha mãe perguntei se ainda existia algum daqueles vasinhos. A mãe saiu um pouquinho e voltou com um vasinho com flores azuis, mal pintadinhas como deveriam ser se pintadas por um menino de dez anos. Ao segurar aquele vasinho na mão eu chorei.

Agora minha mão é literalmente uma mão de homem: grandona, marcada, mas ao mesmo tempo fofinha e delicada. Como a da minha avó.

Acho que a mistura de mão-de-vó com mão-de-homem é mão-de-artesão.

Escrevi esse texto durante a Oficina de Escrita Criativa – Escutar o infantil, escrever a infância da Taís Bravo.

Nos ícones abaixo você pode acessar o Instagram e o Linktree dela para saber de novas oficianas. Recomendo.

Compartilhar:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Postagens relacionadas: